Muitas mulheres têm vergonha e dificuldade em aceitar que a vulva tem odor característico. Assim, valem-se de uma infinidade de produtos e medidas para disfarçá-lo, podendo, com isso, comprometer a saúde ginecológica.
A dra. Renata Lopes Ribeiro, médica assistente da Clínica Obstétrica Fetal do Fleury e da Maternidade São Luiz, ambas em São Paulo, esclarece as principais dúvidas sobre o tema:
1) Toda vagina tem odor? Por que ele ocorre?
A vagina elimina naturalmente secreções e odores resultantes do processo fisiológico de renovação celular, por isso toda mulher tem secreção e odor vaginal. Na maioria das vezes, esse odor é suave, pouco perceptível e pode mudar de intensidade e característica de acordo com as fases do ciclo menstrual.
2) Como saber se o odor vaginal indica a presença de algum processo infeccioso?
É muito importante que as mulheres saibam que toda vulva tem um cheiro natural característico, e que não há nada de errado nisso. Porém, o odor vaginal pode indicar infecção caso mude suas características habituais, fique muito intenso e esteja acompanhado de outros sintomas como coceira, ardência, corrimento vaginal (especialmente de coloração amarelada ou esverdeada) ou incômodo ou dor durante a relação sexual. Nesses casos, os sintomas podem indicar um desequilíbrio na flora vaginal e a presença de processos infecciosos que podem precisar de tratamento ginecológico.
3) O que fazer na presença desses sinais e sintomas?
Esses são sintomas de alerta, por isso é recomendado que, na sua presença, a mulher procure um ginecologista para avaliação. Corrimento e odor forte podem indicar desde infecções mais leves, causadas por fungos e bactérias que se proliferam quando há um desequilíbrio da flora vaginal, até doenças sexualmente transmissíveis, como clamídia e gonorreia. Menos comumente, esses sintomas surgem devido à retenção de objetos, como absorvente íntimo ou camisinha, no interior da vagina.
4) As duchas vaginais são indicadas para a higiene vaginal? Por quê?
Para eliminar o odor vaginal e se sentir mais limpas, algumas mulheres recorrem às duchas vaginais com os mais diferentes produtos. Porém, elas não são recomendadas, uma vez que podem alterar a flora vaginal, atrapalhando a defesa do organismo, além de favorecerem a ascensão de micro-organismos de fora para dentro da vagina. Também podem, dependendo da intensidade, causar micro lesões na mucosa vaginal.
5) O uso de sabonetes e lenços íntimos é recomendado para a higiene íntima?
Os sabonetes íntimos normalmente possuem pH mais ácido (entre 4,5 e 5,5), que se assemelha ao pH vulvar, e são hipoalérgicos. São dispensáveis, ou seja, não são necessários para realizar a higiene íntima adequada. No entanto, algumas mulheres se sentem bem ao usá-los, e podem fazê-lo desde que não os utilizem mais de uma vez ao dia, pois seu uso excessivo pode remover a proteção local e desidratar a pele e a mucosa vaginal.
O uso de lenços íntimos, por sua vez, pode ser um recurso útil quando a mulher não estiver em casa, mas é importante evitar ficções intensas e o uso demasiado.
6) O absorvente diário (protetor de calcinha) ajuda a evitar o odor vaginal?
O uso de absorvente diário é um hábito relativamente comum entre as mulheres, para evitar que a secreção vaginal fique na roupa íntima. Porém, essa prática dificulta a ventilação da área íntima e favorece a multiplicação de bactérias e fungos, portanto deve ser evitada.
7) Como higienizar a região íntima corretamente?
A higienização da vulva (região externa) deve ser feita uma vez ao dia durante o banho, sem fricções intensas, com água e sabonete neutro, durante um a três minutos. Dê preferência a sabonetes sem muita atividade detergente, sem perfume exagerado e que não tenham pH muito ácido. Os sabonetes de glicerina são uma boa opção. Sabonetes com muitos produtos químicos podem predispor a reações alérgicas. Evite, também, o uso de buchas e esponjas.
A higiene excessiva pode piorar o odor vaginal, pois remove a proteção natural local, predispondo a infecções e reações alérgicas.
8) Algumas mulheres reclamam de odor forte durante a menstruação. Como evitá-lo?
A higiene íntima não precisa ser alterada durante o período menstrual. No entanto, é preciso trocar os absorventes internos ou externos com frequência, pois se o tempo de troca não for respeitado, o sangue se acumulará no absorvente, podendo ocasionar mau cheiro.
9) Roupa justa ajuda a intensificar o odor vaginal? Qual a roupa íntima mais indicada?
A roupa muito justa dificulta a circulação de ar no local, o que predispõe ao acúmulo de fungos e bactérias que podem favorecer infecções e causar odor desagradável. Prefira roupas mais largas e opte por calcinhas de algodão.
10) É comum o odor diferir de uma mulher para outra? O que é possível fazer para reduzir o odor mais intenso?
Certas características individuais podem fazer com que algumas mulheres tenham um odor mais intenso, tais como: 1) transpiração excessiva: nesse caso, recomenda-se a troca mais frequente de roupa íntima e que se dê preferência para peças de algodão; 2) obesidade: as dobras da pele podem acumular secreções, pois isso é indicado que se dê atenção especial a essas áreas, mantendo-as sempre limpas e secas; e 3) alimentação: algumas mulheres relatam mudança no odor vaginal quando ingerem alimentos como determinados peixes, alho ou certos suplementos. No entanto, isso é pouco comum e basta evitar o consumo desses alimentos para que o odor volte às suas características habituais.
Sexo Oral
Se toda mulher tem odor na região íntima e essa é uma característica natural e fisiológica, por que tantas mulheres não se sentem à vontade durante o sexo, especialmente por terem vergonha do próprio cheiro?
Um número muito alto de mulheres desconhece o próprio corpo e sua sexualidade. A pesquisa Mosaico 2.0, divulgada em 2015 e coordenada pela psiquiatra Carmita Abdo, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), entrevistou 3 mil pessoas entre 18 e 70 anos de sete regiões metropolitanas do país. Os dados revelam que 40% das mulheres não têm o hábito de se masturbar e 19,5% nunca o fizeram. Já entre os homens, apenas 17,3% não praticam a masturbação habitualmente.
Assim, não é surpresa que 44,4% das mulheres relatem algum grau de dificuldade em atingir o orgasmo e que sejam comuns as queixas de falta de libido nos consultórios médicos.
Por que isso ocorre? A resposta é simples: a desigualdade de gênero, comum à nossa cultura, limita a expressão da sexualidade feminina, que historicamente sempre foi reprimida.
Sem se conhecer nem saber o que de fato lhe dá prazer, como as mulheres podem se aceitar e desenvolver todo o potencial da sua sexualidade, ainda mais considerando que muitas sequer se julgam merecedoras do prazer sexual?
As meninas aprendem desde cedo que se tocar é algo feio e sujo, que deve ser evitado. Os adultos não costumam conversar com elas sobre a importância do prazer sexual e como é possível chegar a ele. Portanto, elas crescem sem estabelecer uma relação de intimidade com o próprio corpo.
Na vida adulta, a desigualdade entre homens e mulheres chega à cama. Elas temem ser julgadas por determinadas atitudes e comportamentos, o que limita o prazer sexual. São poucas as que conseguem expressar suas vontades e desejos com naturalidade, assim como são raros os homens dispostos a atendê-los.
Portanto, ainda é comum que a mulher e a vagina sejam vistas apenas como meios de dar prazer ao homem e trazer os filhos ao mundo. O órgão sexual feminino é tido como feio, desconhecido, algo que não deve ser encarado e aceito. A enorme quantidade de produtos que prometem diminuir e disfarçar o odor vaginal à disposição nas farmácias e drogarias são a prova de que a sociedade ainda não sabe lidar e aceitar o corpo feminino.
Outra pesquisa realizada em 2015 no estado de São Paulo, essa pela empresa Sex Wipes, com 1.252 homens heterossexuais e sexualmente ativos de 18 a 30 anos, revelou que 43% (4 em 10) não realizam sexo oral nas parceiras, embora 78% afirmem receber. Dos que o praticam nas companheiras, 35% dizem não gostar de fazê-lo. O motivo? Nojo: da aparência, do cheiro e da umidade da vulva.
Não há explicação lógica para alguém sentir nojo da pessoa que o atrai sexualmente que não envolva aspectos culturais machistas que nos distanciam, homens e mulheres, do corpo e da sexualidade feminina.
Fonte: Portal Drauzio Varella